Poesia Popular

CAMINHÃO DE ELEITOR

Quer vê festa no Sertão
Inverno fora de tempo.
É época de eleição
Suspendendo o sofrimento
Candidato sorridente
Cesta básica pra famia
O comércio em movimento
Aumentando a freguesia

É pneu de bicicleta
É tijolo em milheiro
Faltando em mercadoria
Substitui em dinheiro
Banguelo todo contente
Pois recebe dentadura
Outro feliz com o caixão
Leva a sogra a sepultura

Triste de quem pedir
Um simples par de sapato
Ganha um pé na política
Torcendo pro candidato
Se ele vencer, recebe
O outro pé bem depois
Fica na ânsia esperando
Vitórida pra ter os dois

Mas bem melhor é a farra
Em cima de caminhão
É zoada, é algazarra
De moleque a ancião
Preto, branco, amarelo
Frango, corno e sapatão
Cabe de tudo um pouco
Com a bandeira de um ladrão

O cortejo corre ligeiro
Jumento travessa no mêi
É uma freada da gota
O desmantelo é fêi
Cai uns pru riba dos oto
Numa folia danada
Tem gente que se aproveita
Pra pegar em parte errada
E já rolando a cachaça
Fica grande a cachorrada

Quando chega no local
Que o comício ta marcado
Retratos pregados em pau
Com cara de procurado
Servem até de estandarte
E vão descendo fardado
Feito bloco em carnaval
Bateria e orquestra
Fazendo um festival
E a turba toda alegre
Busca o cabo eleitoral

Ele manda despachar
Na bodega ali do lado
Umas garrafas de cana
Para aquele eleitorado
E cola uns adesivos
Por cima do rotulado
Pra que fique bem claro
Quem pagou o assustado

Depois de tarem inspirado
Os eleitores fogosos
Aplaudem o converseiro
Dos santos homens honrosos
Que se retiram de cena
Para os mistérios gozosos

E coitado do sujeito
Que se encontra melado
Feito espinhaço de pão doce
Em padaria e mercado
Arregala as bolas dos ói
Com o que é anunciado

Uma banda de forró
Que chamam eletrificado
Sujeito toma um choque
Vendo tudo o que é mostrado
Mulé boa e seminua
Dando um lance danado
E jogando mais as pernas
Num roliço rebolado
O sujeito berra alto:
Eita, forró cabaresado!!

Até que fim chega o dia
Da eleição esperada
O caminhão de eleitor
Desgarra pela estrada
E o cabo eleitoral
Lá no ponto de parada
Pede pra anotar
O título da matutada
Dizendo sem cerimônia
-Se alguém não votar
No candidato da gente
No computador vai acusar
E ele diz certamente
Quem traiu a confiança
De um partido tão decente
Mostra o nome na hora
E eu deixo ir a pé, infelizmente.

Aí o matuto na hora
Sacando a presepança
Entrega o título e vai
Partindo e entra na dança
Já pela boca da tarde
Vem com dois títulos na mão
O cabo eleitoral surpreso
Se vira em indagação
-Que dupla de documento?
Isso é falsificação?

-Que nada meu camarada
Tenha calma, amigão
Faz três campanhas que eu
Sigo ordem de seu patrão
Um desses títulos é meu
O outro é do meu pai João

-Mas, seu pais João morreu,
Já faz mais de uma eleição...

- Morreu foi pra você,
Ta vivo em meu coração
Sou eu que voto por mim
E por ele, por que não?
O meu título e numa escola
O dela é em outra seção
Quem assim me ensinou
Foi o teu próprio patrão
E como vosmicê disse
Que a ta de computação
Descobre quem foi contra
Na hora da votação
Pode deixar pai aí
Não carece levar, não
Que como teu eleitor
Eu vou é no caminhão...




O MEU MOXOTÓ
Josessandro Andrade

Se queres saber da vida,
Bem nos seus confundós,
Se queres saber do mundo
 Vem para o meu Moxotó.
Pode invadir o terreiro,
Que as crias estão libertas.
A natureza acolhe
Com um abraço de poeta.
Ela abre a caixa dos peitos,
Com fulo de catingueira,
Com cheiro de mussambê
Pra incensar a ribeira,
O Moxotó tem boi brabo,
Enchendo as suas pernas,
Em, pegas e vaquejadas,
Onde a poeira serena.
O meu moxotó é colméia,
De amores doces zunindo,
Na rosa das serenatas,
No peito doce bulindo.
O meu Moxotó aconchega
Boêmios inveterados
Mulheres loucas e lindas
No baião dos meus pecados
O meu Moxotó é viveiro
De músicos e poetas
A orquestrarem o canto
Dessas almas inquietas.
O meu Moxotó é feudo
De coronel sem patente,
De verme lá no poder
Na barriga de uma pobre gente.
O meu Moxotó é veneno
Pro pequeno ditador,
Destruir com os pés
O seu filme de terror.
Meu Moxotó de estudante,
Que critica, mas faz festa,
Que grita, mas é sensível
A riqueza que nos resta.
Dos pífanos do Moxotó,
De côco de roda e viola,
Do aboio e do reisado,
Ó chama que nos consola.
O meu Moxotó tem bodegas
Com cachaceiro irreverente,
Com sujeito espirituoso,
Terra de gênios dolentes.
O meu Moxotó tem bares,
Onde o sonho faz carnaval,
Muitas essências e idéias,
A espera do festival,
Onde não haja censura,
Nem covardes oportunistas,
Que se refugiam omissos,
Com o rótulo de artistas.
Pois quem é escuta o galo,
Que do poleiro das ruas,
Dá as frescas verdades,
Que se esvoaçam tão nuas...
Pro Moxotó que faz rede
Estendida como um cordel,
Lançada no mar deserto
Para pescar menestrel.
O meu Moxotó tem novenas,
Incelenças, rezadeiras,
A desaguarem a fé
Na ópera das lavadeiras.
Meu Moxotó tem artesanato,
Com escultura alongada,
Que do sertanejo só falta
Sua fala arrastada...
O meu Moxotó é bode,
Em sarapatel e buchada,
Carne, leite e couro,
Valia submestimada...
O meu Moxotó não se rende
A miséria de humilhações
Se levanta bem digno
Com o repente dos rojões
Que elevam o Moxotó
Aos céus mais sublimes
Onde a poesia é Bíblia
Que absolve nossos crimes.

BALADA DE CORTAR A VOZ

Não faz pouco tempo, não!
Nas matinês da existência
Eu sonhei pegando fogo
O cinema da adolescência.
O incêndio do teatro
No jornal dos meus dias
Era manchete ardente,
Letras saltando em folia.
Você se fez arraial
Na vila da imaginação,
Eras espiga dourada
Em fogueira de São João.
Fez de folhetos de cordel
As bandeirinhas juninas.
Pareciam saia ao vento,
Lance de moça-menina.
Não faz pouco tempo, não!
Eras atriz de vanguarda,
A musa dos seminários,
A flor de nossas jornadas.
Então preferimos veredas
Dos mais frágeis assoalhos:
Feito gatos caímos em pé!!
Ah! Questões de família e trabalho...
Mas, hoje decepcionados
E talvez desiludidos
Na ânsia de encontrar
O rumo que foi perdido...
Ah! Meu delito é ousado,
Não dá máscaras as emoções,
Toma coragem e revela
A verdade das sensações.
Os teus olhos ciladas
Como lírica perturbação
Faz subir pelas paredes,
Depois rolar pelo chão
Os teus olhos ciladas
Punhais na lei da razão
Corta os pulsos da aparência
Pra cair em tentação.
Tentação de achar teus lábios
Como se um caldeirão fosse
E tua língua colher de pau,
Na fervura, a mexer o doce;
E misturar nossas bocas
No vinho das gargalhadas,
Na anarquia das pernas,
O néctar das madrugadas,
Que nas tuas alvas coxas
Faz a mais bela morada.
Sem importar-se com nada
Do que dizem ser proibido,
Também falam ser a melhor
A paixão que ama escondido.
 volúpia louca e linda
Vai tomar conta de nós,
No gozo de nos adentrarmos
Vai ser de cortar a vooooooooooooooozzzzzzzzzzzzzzz...
(2004)




MUSA DOS FESTIVAIS

Tenho desejo ao te ver
No palco flor bailarina
Em compassos de mulher
Com seu riso de menina
Emoldura tua cintura
Com as pétalas de uma abraço
Pra no balé das essências
Nos unirmos num só laço
Tenho desejo liberto
De ser pego no flagrante
O cartaz do teatro aplaudindo